O tempo arrastava-se pelos ponteiros do relógio, custando a passar. Após o almoço, finalmente, aconteceria o tão aguardado compromisso que nos levara àquelas paragens. Às 16h15 a senhora discretamente aproximou-se de nós e entendemos que chegara a hora. Saímos da pousada e ela guiou-nos pelas ruazinhas estreitas daquele vilarejo até o local indicado. Ali, um pequeno furgão nos aguardava. Embarcamos, sem as apresentações habituais. Nenhuma pergunta nos fora feita, e nós respeitamos o silêncio solene de nossos guias.
A viagem foi longa. Cada vez mais e mais nos afastávamos de nossa vila de origem. O ar ia ficando mais frio e rarefeito pela subida. Observávamos a paisagem, enquanto a tarde anoitecia. Logo um céu estrelado fazia parte da longa e estreita estrada que serpenteava em torno das montanhas azuis. Apenas o sibilar do vento fazia-se ouvir, e a cantilena rouca do motor de nosso veículo. O frio era intenso. Num dado momento, o furgão parou, e um senhor idoso, de semblante muito tranquilo, a face recoberta por uma barba bem cuidada e gestos aristocráticos solicitou-nos que vedássemos os olhos com os lenços que nos oferecia. Obedecemos. Alguns metros adiante, o carro mudou o itinerário, fazendo uma curva abrupta à esquerda. Mais alguns minutos se passaram, até que o automóvel parasse e, cuidadosamente guiados, iniciamos uma caminhada a pé, subindo por um caminho tortuoso, apoiando-nos uns nos outros. Num dado momento, pelo eco de nossos passos e pela ausência de vento, nos demos conta de que estávamos num lugar coberto, e não mais ao ar livre. Paramos. Três batidas ecoaram e percebemos que uma porta se abria. Cada um de nós foi recebido por mãos que nos guiaram separadamente. Tínhamos certeza de que os outros estavam lá também, porem não nos comunicávamos.
Um filete de luz, tênue, começou a passar por nossas vendas, até que percebemos que a claridade imperava. Fomos convidados a sentar e a retirar as vendas. Estávamos numa espécie de átrio amplo, semicircular, feito de pedras. Quando nossos olhos acostumaram-se novamente à claridade, percebi alguns desenhos, como jamais tinha visto, decorando as paredes iluminadas por archotes. Diante de nós estava um grande portal de madeira maciça, frente ao qual perfilavam-se homens e mulheres vestindo longas túnicas negras. Túnicas que nos ofereceram, também, e que colocamos por sobre as roupas, quando retiramos os pesados agasalhos. O ambiente era frio, mas nada igual ao que deixamos do lado de fora, durante a caminhada. O local estava mergulhado num silêncio quase palpável. No ar recendiam aromas de velas acesas e de incenso. Uma suave melodia chegava até nós, de cânticos semelhantes aos gregorianos. Pressentíamos que em breve iríamos participar do aguardado ritual de acolhimento. Nossos olhos foram novamente vedados, e a pesada porta se abriu…(Ludmila Saharovsky)
Continua na próxima postagem.
E daí, e daí, e daí ???