Rota das Charqueadas

Hoje, fizemos a Rota das Charqueadas em Pelotas e conhecemos duas propriedades maravilhosas: a Charqueada Santa Rita (construída em 1826) e a Charqueada São João (construída em 1810).
Charqueada é o nome que se dá no Rio Grande do Sul, à área da propriedade rural em que era produzido o charque, utilizando para isso o trabalho dos escravos.
A consolidação dessas grandes propriedades rurais de caráter industrial, deu-se no século XIX, às margens dos arroios Pelotas, Santa Bárbara e canal São Gonçalo.
O gado, matéria-prima, era proveniente de toda a região da campanha rio-grandense e era fruto da multiplicação de exemplares trazidos pelos espanhóis para a Banda Oriental no início do século XVII.

A safra era sazonal e durava de novembro a abril. As charqueadas tinham em média 80 escravos, ocupados nos intervalos da safra em olarias nas próprias charqueadas, derrubadas de mato e plantações de milho, feijão e abóbora nas pequenas chácaras que cada charqueador possuía na Serra dos Tapes, onde ficam hoje a Cascata e as colônias de Pelotas.(Fonte Internet)

Hoje, A Rota das Charqueadas é opção de turismo. Além das visitas monitoradas às residências, pode-se fazer também um passeio pelas mansas águas do Arroio Pelotas, de onde se avistam as moradas que faziam parte do ciclo do charque.
O nome da cidade, Pelotas, originou-se das rústicas embarcações utilizadas pelos nativos na travessia dos rios, confeccionadas com o couro animal e quatro varas corticeiras. Essa embarcação, semelhante a uma cesta, ou a uma bola, possuía uma corda que era colocada feito cabresto, na boca dos escravos, que a conduziam a nado, pelo rio.

Charqueada Santa Rita

Esse rio maravilhoso, era conhecido no século XIX como Rio Vermelho, pois recebia todo o sangue do abate das toneladas de animais, das mais de 40 Charqueadas lá existentes.

Charqueada São João – Aqui foi filmada a série “A casa das Sete mulheres”

Foi um domingo e tanto! Espero que vocês também tenham aproveitado,virtualmente, o passeio. Abraços! (Ludmila)

    

    Paisagem na neblina

    Que montanha e essa que vejo como se sonhasse, com seus picos sólidos adormecidos na paisagem? Catedral de pedra, recortada no cenário, ela perpetua seu mistério na superfície dos dias. Ser ancestral, moldado em terra, pouco a pouco ela me absorve e aprisiona em seu ventre e me povoa com sua historia de abismos. Nela reencontro a mulher. Ela continua só e me aguarda. Caminha em minha direção, os pés descalços, o corpo silenciado pela quietude dos sentidos, com a cor da desesperança preenchendo o olhar. Mulher outra, mas tão minha conhecida! Observo-a por entre as palavras. Ela é una com as falésias, e eu a ouço e compreendo. Ah! Quero tocar em seus cabelos, pegar entre as minhas as suas mãos, e conduzi-la para além dessas pedras, onde, independente de sua vontade, gestou-se esta paisagem na qual ora me encontro. Talvez eu pudesse fazê-la sorrir, envolve-la com meu carinho, faze-la perceber o frágil equilíbrio entre o passado e o futuro, mas não! Perdi-me dentro de mim, num deserto sem saída que se instalou em minha alma perplexa. E agora, estou aqui, parada, olhando para seu vulto que se reflete nesses espelhos de pedra, hipnotizada por sua presença. Então, a mulher me toma mansamente pela mão e juntas penetramos nesse universo de pedra entalhado na neblina. O tempo abre-se então, numa paisagem de outrora. Sinto o corpo todo estremecido pelas emoções reprimidas. Vomito minha dor, grudada há anos na garganta e grito: Por quê? Por quê? E essa pergunta é a chave que me permite abrir uma passagem em sua alma e penetrar enfim no mistério! Seu rosto desliza pelo tempo, e eu passo a enxergar através de seus olhos, repletos de espanto, a sentir suas emoções, a aguardar, pacientemente, a revelação dos fatos. Observar o sol nascer do mesmo ponto, todas as manhãs, o espaço infinito de água, a sonhada liberdade, a impossível fuga desta ilha de pedra, minúsculo ponto perdido na imensidão do mapa. Olhando para ela, espelhada em mim, eu penso: E agora? O que farei com essa paisagem inscrita também em seu destino? Saberei contar nossa história?
    Ludmila Saharovsky
    (trecho de meu diário escrito em Solovki, em 2003)

       

      O eterno agora


      A mulher: Olhos perdidos no horizonte. Pensamentos que sobrevoam repetidos naufrágios.
      A mulher: Pele tatuada pelo tempo, sentidos que a arrastam para espaços familiares repletos de alaridos, de cheiros e sabores únicos, quase mágicos, de outrora.
      A mulher: Incrustada no silêncio. Ser clandestino numa cidade que a mantém ancorada na beira dos dias, desejosa de trocar palavras com a leveza com que se trocam carícias.
      A mulher: Vestida de saudades!

      Ela observa a tarde que cai sobre as falésias: o mar cinzento, o céu despojado de nuvens, o repetido mergulho das gaivotas em busca de alimento. Um cão correndo à volta de seu dono, temeroso de perdê-lo. Igual a ela, pensa, retornando sobre seus passos em busca de algum tênue sinal que lhe indique o perdido mar interno.
      Ela retém em si esse momento. Fecha os olhos e o revê, certificando-se de que a paisagem estará sempre dentro dela, mesmo quando, distante, já não puder focá-la.
      E assim, entre o sol que se põe, e o mar que se encrespa, ela viaja. Segue por um itinerário que se sobrepõe ao tempo e à memória. Lembranças de antes desta paisagem tingida pelas cores do crepúsculo. Vestígios de quando tinha asas, e seu pensamento em chamas procurava avidamente a agitação dos sentidos, a certeza de que haveria para sempre um tempo de descobertas. Tempo em que tudo era excessivo, e mesmo assim não lhe bastava. Tempo tão diferente desse, em que viaja vigiando emoções, num ritmo compassado, acompanhando a exatidão da maturidade que pulsa dentro. Buscando não mais a felicidade superficial, mas daquela outra, secreta, que lhe permita encontrar a alegria mais consistente, o existir mais pleno, a emoção mais verdadeira.
      O corpo da mulher segue sem pressa. Corpo nave, entregue à plenitude e ao sonho. Tudo tão próximo e tão distante, e o distante quase na ponta de seus dedos, gravado nas linhas de suas mãos, imerso num feixe de luz e sombras.
      Então, a mulher já não vê mais o mar à sua frente. Apenas o pressente. E regressando pela porta que se abre entre o ontem e o amanhã, ela ancora, tranquila, na eternidade do agora.
      Ludmila Saharovsky
      (crônica publicada no jornal O Valeparaibano)

        

        Mundo Etéreo


        Nosso Grupo do Teatro do Interior, em foto comemorando o sucesso do espetáculo Mundo Etéreo em S.José dos Campos.
        Direção Geral Marilda Carvalho
        Bailarina e Coreógrafa Cristiane Azevedo
        Direção de Arte Malu Santiago
        Fotos Adilson Machado
        Frases sobre a leitura do espetáulo Ludmila Saharovsky
        Iluminação Paulo Carvalho
        Duração:46min.
        Sucesso absoluto! Casa cheia!
        Parabéns à toda a equipe!

          

          Dailor Varela: carta ao amigo


          Há pessoas na vida da gente que chegam pra ficar.
          Ficar de uma forma tal, que nem a morte nos separa.
          Dailor é um deles.
          Temperamental? Sim.
          Estranho? E quem de nós não é?
          Recluso? Tímido? Inconstante? Passional? Revoltado? Caprichoso? Apaixonado?
          Não sei que adjetivo desses, que sempre lhe emprestaram, mais se aplicaria para defini-lo. Para mim Dailor é uma dessas almas peregrinas que não se adequou aos tempos em que vivemos.
          Sonhador, romântico, sensível, eu o vejo, agora, deitado em sua nordestina rede, em sua casa lobatense, conversando com as estrelas.
          Talentoso, de escrita fluente e personalíssima, um dos cem mais importantes poetas brasileiros, Dailor presenteou-me a vida toda com sua amizade.
          Trocamos um baú de cartas, confidências, bilhetes. À minha leitura e comentários confiou os manuscritos de seus últimos livros.
          Nos envelopes das cartas que me endereçava, escrevia:
          Para Ludmila Mayakovski, “princesa das estepes russas”
          Certa feita, o síndico do apartamento que ocupamos em Niterói, vendo minha correspondência, pergunto-me se eu era “irmã do poeta russo”…
          “Do Mayakovski? Não!”. “Sou irmã desse poeta nordestino que me escreve”…
          Todas suas cartas vinham datilografadas, com correções feitas à caneta vermelha, com recortes colados, rabiscos, manchas, impressões digitais. Sempre uma viagem!
          Certa feita, em meu aniversário ele me presenteou com uma foto minha, segurando uma bola de cristal, recoberta por recortes de seus poemas, recortes de crônicas que escrevi e desenhos rabiscados à caneta Bic na volta. Eu, com uma coroa russa sobre a cabeça. E tudo isso embrulhado num pedaço de jornal, como era seu costume…
          Como nos conhecemos?
          Assim: Eu era uma aspirante a cronista e ele já um jornalista famoso, recém vindo para o Vale do Paraíba, “importado” da revista Veja. Lembro-me de que eu estava super insegura em conhecê-lo, na Galeria do Sol do Ênio Puccini, sentada no chão, rodeada pelas gravuras de Arlindo Daibert – que Ênio estava organizando para expor- quando adentrou a sala um rapaz magro, tímido, de cabelos encaracolados, óculos de aros redondos, calça jeans, sandálias franciscanas, uma larga bolsa de couro já gasto, jogada nos ombros sobre uma bata branca, cearense, que Ênio me apresentou:
          “Dailor Varela, Ludmila.”
          “Ludmila, Dailor”
          O “Olá, como vai?” saiu à fórceps de sua garganta, gaguejado, mais para o chão do que para mim, mas, o aperto de mãos uniu-nos para sempre, com esses laços que só a amizade, o carinho, o respeito e a admiração sabem atar.
          Boa viagem, meu amigo querido, e não se esqueça desta sua princesa russa, deserdada e, agora, órfã também, deste outro lado do espelho, onde você a deixou.
          Com amor
          Ludmila Saharovsky
          em 15 de abril de 2012- manhã de sol lindo e céu de brigadeiro para Dailor navegar

          (xilo do artista plástico Arlindo Daibert, de onde saíram as colagens de Dailor)

             

            Casa de Cultura Mario Quintana e outros lugares pitorescos em POA

            Amigos, há dificuldades que se transformam em descobertas.
            Viajar de Rio Grande, onde resido, para Jacareí, onde moro, acaba sendo uma maratona de dois dias de locomoção. Rio Grande fica a 5 horas (vindo de ônibus) de Porto Alegre. O último coletivo sai ás 20 hs. e o primeiro às 6 da manhã. O único vôo da Azul, direto para SJcampos é às 6hs55, assim, a única alternativa de que disponho é chegar na véspera em Porto Alegre e aproveitar o que a cidade tem de descobertas para oferecer. E como tem coisa! Porto Alegre é cosmopolita, de arquitetura belíssima e povo muito hospitaleiro.
            Para vocês terem uma idéia, eu, inadvertidamente, cheguei numa segunda feira, quando os espaços culturais estão fechados. Assim mesmo, arrisquei e, munida de minha “saboneteira”, como chamo minha máquina fotográfica, tomei o metrô e dirigi-me ao centro da cidade. O calor estava insuportável: 42 graus!
            Eu estava ansiosa para conhecer o espaço cultural Mario Quintana, e para lá me dirigi. Caminhei, da última estação de metrô a pé, observando o burburinho da cidade.
            Chegando ao antigo Hotel Magestic, onde Quintana viveu de 1968 a 1980, fui informada de que a maioria das exposições estaria fechada, por conta de ser uma segunda feira. Fazer o quê?
            “Mas posso ao menos ir até o quarto onde viveu o poeta?”
            “Sim! É só subir pela escadaria, ou elevador, até o andar.”

            Admirar a intimidade do poeta, por trás da vidraça que protege o quarto das invasões dos fãs, já valeu a viagem, o calor, a canseira! Mario Quintana passou grande parte de sua vida vivendo em hotéis. No Magestic, no centro histórico de Porto Alegre, o poeta residiu até ser despejado, quando o jornal Correio do Povo encerrou temporariamente suas atividades, por problemas financeiros. Quintana, sem salário, deixou de pagar o aluguel do quarto. Na ocasião, o ex-jogador da seleção Paulo Roberto Falcão cedeu a ele um dos quartos do Hotel Royal, de sua propriedade. A uma amiga que achou pequeno o quarto, Quintana disse: “Eu moro em mim mesmo. Não faz mal que o quarto seja pequeno. É bom, assim tenho menos lugares para perder as minhas coisas”
            Essa mesma amiga, contratada para registrar em fotografia os oitenta anos de Quintana, conseguiu um apartamento no Porto Alegre Residence, um apart-hotel no centro de Porto Alegre, onde o poeta viveu até sua morte. Ao conhecer o espaço, ele se encantou: “Tem até cozinha!” espantou-se…
            Mário Quintana não se casou nem tinha filhos.
            Pois então poeta, lembrei-me de seu
            POEMINHA DO CONTRA, agora que você tornou-se o passarinho que anelou ser:
            Todos estes que aí estão
            Atravancando o meu caminho,
            Eles passarão.
            Eu passarinho!

            (Mario Quintana)

            Depois de permanecer por um bom tempo, imaginando o poeta em seu quarto, havia um outro espaço que eu queria muito visitar, no mesmo prédio, no mesmo andar: O acervo de Elis Regina. Estava trancado! Não tive dúvidas: dirigi-me até à sala da administração e expus o meu problema: “Venho de São Paulo para conhecer esta casa e, azar o meu! As exposições estão todas fechadas para o público!”
            Para minha surpresa, a funcionária levantou-se, pegou uma chave, simplesmente, e me pediu que a seguisse. Abriu a porta, entregou-me a chave e disse: “É responsabilidade sua. Entregue em minhas mãos quando sair.
            Eu não acreditei! De repente, por algumas horas, tinha o acervo de Elis Regina só pra mim, e me tornei a guardiã daquele espaço mágico! Só mesmo a fidalguia gaúcha pode explicar esse episódio! Agradecer foi pouco!

            Fotos tiradas, documentos lidos, músicas ouvidas, entreguei a chave com meus agradecimentos à administradora do espaço e prossegui na exploração do prédio, maravilhoso, com seus cafés, bibliotecas, livrarias, teatro, auditórios, jardins internos e externos, loja de souvenires, exposições de artes plásticas e tudo o que minha alma pode usufruir. Voltarei com certeza, e em breve, para tomar um café no mezanino do último andar, que estava fechado, com a vista para o maravilhoso Rio Guaíba!
            Mario Quintana, me aguarde! (Ludmila Saharovsky)

            Depois de explorar todos os espaços possíveis, no Centro de Cultura, instalei-me na simpática cafeteria do andar térreo e busquei informações, enquanto matava a sede e me refazia do calor insuportável que estava fazendo. A dona da cafeteria me informou que eu não poderia deixar de visitar o centro histórico, com sua Catedral Metropolitana, o Secular Mercado Público, que tomava todo um quarteirão e e nem o Centro Cultural da Usina do Gasômetro, que, infelizmente também não abria às segundas feiras…e lá fui eu.. As fotos falarão por mim!


            Aqui eu voltarei, com certeza! Só não pode ser numa segunda feira…

            E agora 0 MARAVILHOSO Mercado Público Municipal, construído em 1858 em estilo neoclássico. onde terminei o dia tomando um delicioso açaí na tijela e observando a paisagem que se estendia à minha volta. Minha imagem vai bem borradinha, mas é a única que tenho para provar que estive aí…

            E agora esta foto que peguei desse link, para que vocês tenham uma idéia da magnitude dessa arquitetura:
            http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=537310


            Bom…por hoje é só! Espero que vocês tenham aproveitado comigo esse breve passeio por Porto Alegre!
            Um beijo a todas as pessoas queridas que me seguem por este site!
            (Ludmila Saharovsky)

              

              Festa do Mar em Rio Grande

              Hoje, domingo de Páscoa, terminou a tradicional Festa do Mar que acontece todos os anos no Antigo Cais do Porto em Rio Grande.
              Aproveitamos o lindo cenário e depois a Lua Cheia de um lado da Lagoa dos Patos, e o por do sol do outro.
              Um cenário fantástico que, por aqui é o habitual…

              Quando voltamos para casa, temos a Lagoa dos Patos nas duas margens da estrada, compondo o cenário: de um lado nasce a lua, e do outro o sol se põe. A gente não sabe pra que lado olhar, literalmente…

              E, de repente, surge uma estrutura metálica incendiada pelo poente…

                

                Páscoa


                Confesso! Há épocas do ano em que me sinto muito antiga. Fico como que desfocada, totalmente excluída dessa realidade que me envolve.Tento mergulhar na rapidez do tempo presente e sua nova realidade, mas algo me arrasta inexoravelmente ao passado. É feito uma nostalgia: Uma saudade que surge devagarinho e quando me dou conta, ela já se instalou, e pronto! Entro no túnel do tempo e regresso à minha infância. E é sempre durante a Semana Santa que tenho as piores recaídas. Esse período chega despertando em mim uma solenidade, uma severidade, um mistério que hoje não mais se vivenciam. No antigamente, tudo ficava vagaroso e triste nesses dias. O martírio de Jesus refletia-se nos lugares, pessoas e costumes. O silêncio era mais denso, o luto materializado. Eu e minha família assistíamos à missa todas as noites, no monastério ortodoxo de Vila Alpina. Ouvir a leitura dos evangelhos no templo aconchegante iluminado apenas pela luz de velas, o insenso acalmando os sentidos, resultava num consolo mágico à alma dos que acompanhavam o drama da traição. Aquela, perpetrada por um dos discípulos queridos do Mestre e a negação, por três vezes, de outro. O julgamento de Poncio Pilatos, lavando as mãos num gesto que o eximia de qualquer culpa, a Via Crucies percorrida sob o peso da cruz e chibatadas, o terror da crucificação, do coroamento com espinhos eram novamente vivenciados por nós. A noite surgindo em pleno dia sobre o Gólgota, a cortina do templo rasgando-se de alto a baixo, a lança perfurando as vértebras de Jesus, a descida do corpo morto, o sudário. A pesada pedra selando o sepulcro. Esse enredo permeava de angústia meu coração de criança que doía e se apertava em nó no peito, por tantas crueldades perpetradas contra um inocente. Os aparelhos de rádio e de TV. permaneciam desligados na maioria das casas. O máximo que se permitia era assistir aos filmes bíblicos, reprisados a cada ano, com Débora Kerr, Victor Mature, Charlton Heston, Jean Simmons, sobre a Paixão: Paixão de Cristo. Carne não se consumia, e não apenas na Sexta-Feira Santa, mas durante toda a semana. Os mais devotos passavam sem ingeri-la, a quaresma inteira. Finalmente chegava o Sábado de Aleluia e pelas ruas dos bairros procedia-se a malhação do Judas. Em inúmeros postes ele era amarrado e espancado até a completa destruição, quando as palhas soltavam-se de suas entranhas de trapos. Que ritual! Parecia que, espancando o delator, finalmente, a justiça era feita! Absolutamente ninguém se lembrava do “Pai, perdoai-lhes porque não sabem o que fazem” que o próprio torturado suplicara naquela longínqua época!
                Mas, o mistério dos mistérios, para mim, eram os ovos de coelho. Eles surgiam multicoloridos, em ninhos, na maioria das casas, como por encanto. Nunca conseguiram explicar-me, que relação havia entre ovos e a Ressurreição. E de coelhos ovíparos, ainda por cima! Recentemente, li que essa tradição é celta, e liga-se a Eostre, deusa da vegetação e do renascimento. Mas, a quem, realmente, isto hoje interessa? Vivemos um tempo em que mistérios caíram em desuso. Como toda a tradição desta dolorosa Via Crucies que um dia nos redimiu…
                Feliz Páscoa!

                (Ludmila Saharovsky)
                (Crônica publicada no Jornal O Valeparaibano)

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