Estamos vivendo tempos muito complicados.
Paira no ar um certo desconforto, uma intolerância, um baixo astral que vem opondo irmãos, amigos, conhecidos que já não se reconhecem e começam, infelizmente. a se desprezar.
Há os que adotaram a cor verde/amarela como bandeira e há os que foram hipnotizados pela vibração do tom vermelho, e o complicador é que estamos todos lado a lado, navegando num mesmo barco que se encontra à deriva.
O enorme Titanic no qual viajamos está prestes a ir à pique. O iceberg da corrupção cresceu tanto (e hoje vislumbramos apenas a sua ponta) que, fatalmente, afundará o navio, e então estaremos, todos, no Mar das Tormentas.
Haverá embarcações e boias para que todos nos salvemos? Não sei, mas logo, logo saberemos. Inevitável se torna, a essa altura, evitar a tragédia anunciada.
Os passageiros da primeira classe celebram a vida no convés, enquanto o comandante nos leva para águas cada vez mais turbulentas. E nós, viajantes do andar de baixo, somos obrigados a alimentar as chamas da caldeira, com o suor de nosso corpo e o esforço sobre humano de nossos braços já cansados de remar contra a maré. Sentimos então, uma tristeza, um desânimo, uma angústia sem tamanho. Onde estará o tão sonhado porto de chegada para que, em fim, desembarquemos?
Que itinerário é este que não escolhemos, perguntamos exaustos e começamos a nos revoltar contra tudo e contra todos: contra o navio, o capitão, a classe executiva, o mar revolto… e nossa tristeza é substituída pelo ódio. Pela raiva. Pelo medo. Passamos então a dar espaço a todos os demônios que habitam o nosso lado negro. Vociferamos contra o comandante, amaldiçoamos seus imediatos, maldizemos os passageiros privilegiados e anelamos, do fundo de nossa alma, que este navio vá à pique! Mas, detalhe: também estamos nele! Caso o navio afunde, todos pereceremos nessa viagem.
A única forma de sobreviver que nos resta, é olharmos para o distante horizonte e acreditarmos que a tormenta há de passar em breve. Então, nos agarramos ao leme da esperança, e oramos para que a justiça, a ética e a moral prevaleçam neste mar revolto e nos conduzam novamente à terra firme. (Ludmila)
(Crônica para a Revista Absollut com fotografia de Noell S. Oszvald)