Mel de violetas
Caros amigos que me leem, eu nunca vivenciei algo semelhante. Acreditem se quiserem: A porta do meu armário de cozinha abriga uma colméia! Tudo começou quando uma abelhinha solitária resolveu adentra-lo pelo orifício da fechadura.Dona Wanda, minha assessora para assuntos domésticos, contou-me o ocorrido, mas eu, dispersiva como toda criatura que tem gêmeos no ascendente, registrei a informação em alguma gaveta de meu cérebro e prossegui em minhas múltiplas atividades, fato que me enquadra naquele percentual de seres que conseguem alhear-se de algumas informações, às vezes até importantes.
Pois bem, passados alguns dias, mergulhada na tarefa de preparar o almoço domingueiro, ouvi um tênue farfalhar vindo do móvel em questão. Meu Deus! Seriam baratas? Ah! Eu odeio com todas as forças de minha alma esta espécie asquerosa de insetos! Não consigo, por mais que me esforce, entender sua serventia para o equilíbrio da natureza. O almoço que esperasse! Retirei gavetas, mantimentos, talheres, louça, panos de prato.Revirei o armário de ponta a ponta, e nada! Quando recolocava no lugar o último copo,de novo, o ruído! Olhei, apurei a vista, coloquei os óculos:Nada se mexia! Sentei-me desanimada, olhar perdido pelas paredes, e eis que, de dentro do orifício da porta surgiu uma abelha. E atrás dela outra e mais outras.Num voo curto sobrevoaram o espaço da cozinha e pousaram sobre o açucareiro, depois sobre o pote de mel e, como que seguindo um roteiro pré estabelecido foram deliciar-se com as flores das violetas, dispostas em vasinhos nos beirais das janelas. Íntimas do espaço, em fila indiana, retornaram ao ponto de partida, ou, melhor dizendo, à porta de partida.
Encantada com a descoberta, chamei pelas crianças: “Venham depressa, ver as abelhas na cozinha da vovó!” Qual o que! Os desenhos do Discovery Kids estavam bem mais interessantes, e eu precisando de testemunhas! Gritei por meus filhos, que me responderam: “Mãe, mas qual é a urgência de ver abelhas na cozinha?” ”Mas não são abelhas voando, simplesmente na cozinha, gente” “Elas formaram uma colmeia escondida dentro da porta do armário, que deve estar cheia de favos repletos de mel em seu espaço oco” “E o mel logo estará vazando pelas frestas” “E a casa inteira embalada pelo zumbido atrairá a atenção dos vizinhos que espalharão a novidade.” “ E virão os repórteres e ficarão de plantão em frente à nossa casa, para transmitirem ao vivo”. “E o mel, não será qualquer um não! Será mel de violetas!” “ E, já pensaram que a porta, agora cheia de vida, poderá recuperar sua memória de cedro e brotar, abrigando entre seus galhos pardais e beija flores…e a mesa da copa seguir-lhe o exemplo?” “E a hera estampada nos azulejos começar a se espalhar, e contornar a geladeira, o botijão de gás””E se as rolinhas se aninharem no forno de microondas?” “Eu não conseguirei mais manter os gatos à distância, nem as borboletas, nem os grilos!”
“Lá vai a mãe, viajar de novo, e nosso almoço, dona Lud como é que fica?”
Ah! me desculpem os filhos, os netos, as visitas domingueiras, mas, uma porta produzindo mel,quem é que aguenta? Claro que eu tive que correr ao computador, e documentar o ocorrido: Mel de violetas. Vocês acreditam? Não? Pois venham experimentar! Já está todo engarrafado! (Ludmila Saharovsky)
Mel de violetas
5