Somos frágeis barcos sobre as horas
Fernando Campanella
Porto é lugar da memória
atrelemos o desejo às ondas –
somos barcos, frágeis barcos
sobre as horas.
João Guimarães Rosa (1908-1967)
No parque morno, um perfumista oculto
ordenha heliotrópios…
Deixa aberta a janela…
Minhas mãos sabem de cor o teu corpo,
e a alcova é morna…
Apaguemos a luz…
Não sentes na tua boca
um gosto de papoulas?…
Passa o lenço de seda de tuas mãos
sobre minha fronte,
e não me digas nada:
a febre está, baixinho, ao meu ouvido,
falando de ti…
I
Busco o poema
Lá onde o mar transborda
E o céu assoma
Ostentando já a lua
Refletida.
No olho da gaivota
O sol se deita
E a palavra nasce
Do silêncio
Assim…
Quase perfeita
Envolta pela areia
E pela espuma
II
Busco o poema
Ou ele é quem me espreita
Em meio à areia brilhante
Liquefeita
Como se fosse um verbo
A imantar-se
A transformar-se
Em som, palavra, grito
Vindo da sombra
Para o atrito
Em seu rumor eterno
(Ludmila Saharovsky)