(Esta imagem é do fotógrafo profissional e jornalista científico, Laurent Laveder, que criou a série Moon Games, composta por diversas imagens que mostram pessoas interagindo com a Lua. Laveder faz parte do coletivo The World At Night, que reúne 30 dos melhores astrofotógrafos do planeta.)
Receitinha de escrever…
Tão bom seria se houvesse receita de bem escrever! Pois eu acho que ela existe e vou revelar-lhes a que eu fui descobrindo, aos poucos…
Em primeiro lugar, é preciso ter sempre à mão lápis e papel, porque o fermento da escrita cresce e transborda da gente a qualquer hora e em qualquer lugar, então, prevenir é sempre o melhor caminho!
Ter a certeza absoluta de que há muitos enredos dentro da gente. Escrever é apenas abrir a porta e permitir que eles saiam: livres, selvagens, indomados. Postos para fora, aí sim, caberá a nós colocá-los sobre os trilhos da história.
Um escritor precisa desenvolver também outros ofícios, que lhe permitirão trafegar com maior segurança pelo mundo das idéias. Por exemplo: Tem que saber ouvir o mar. O mar fala o oceanez, um dialeto dominado pelas gaivotas e pelas sereias. Não sei se os tubarões o compreendem, mas, os golfinhos, com certeza!
Conversar com as violetas também ajuda. Sabiam que as violetas, assim como todas as flores miúdas são poliglotas? Meu avô conversava com elas em russo. Agnes, minha amiga de infância, em francês. Taeko, minha vizinha, fala com elas em japonês. Eu converso mesmo no bom português, e elas respondem a todos com buquês cada vez mais coloridos. Aprendi com as violetas, que o cravo nunca brigou com a rosa! Isso é intriga de gente sem assunto, e dá uma bela discussão e até uma boa crônica!
Um bom escritor precisa também, e sempre, olhar para o céu diurno e ler as histórias que as nuvens sabem contar como ninguém! Pegue a criança mais próxima a você (pode ser, inclusive, a sua criança interna)e deite-se num gramado próximo, ou na praia, ou no quintal mesmo, e deixe a nuvem guia-lo por castelos, jardins, florestas,labirintos…A nuvem entra na cabeça da gente e nos deixa prontinhos para criar quantos enredos conseguirmos!
Ah! Numa receita de bem escrever, não pode faltar nunca a magia. Magia de capturar o cheiro da terra molhada após a chuva de verão, do salto do grilo trapezista, da organização das formigas, em fila indiana, levando gravetos para construir suas muralhas subterrâneas, do raio de sol anunciando o alvorecer (ou o anoitecer, tanto faz, desde que a gente o capture com o olhar…) Nossa! Quantas histórias podem ser escritas observando o céu tinto de rosa e lilás!
E, um bom escritor precisará de abrir seu coração e alma para a poesia. Poetas usam uma linguagem simbólica que modifica as palavras e nos permite transgredir, filosofar sobre a dor e o prazer, revelar o indizível. Bem dizia Guimarães Rosa que a poesia era “uma irmã incompreensível da magia”. Citando Rubem Alves ( aqui faço uma observação: ter a companhia de escritores que nos inspiram, é um ingrediente importantíssimo nesse processo. São eles que, generosamente, nos deixam entrar em suas criações, ter acesso à sua visão de mundo, o que nos fornece subsídios para imaginar a nossa própria receita) Mas, citando Rubem Alves: “meu rio de pensamentos foi surpreendido por um peixe dourado que repentinamente saltou de dentro de suas águas e falou um poema – os poemas moram sempre no fundo das águas…” eu complementarei que, não só os poemas, mas todos os escritos “moram sempre no fundo das águas”! Das águas de nosso oceano interno, tão rico, único, diverso e inexplorado.
Então, terminando essa minha explanação eu direi a vocês: Um bom escritor precisa, com a máxima urgência, aprender a nadar! (Ludmila Saharovsky)
PS. Sabem quantas vezes eu reli esse texto antes de publicar?
Vocês nem imaginam…e com isso, segue o segredinho final: escrever, ler, reler, burilar a escrita, experimentar novas coberturas, acrescentar, tirar e ler, reler, lapidar, escrever, apagar, reescrever…