Queridos amigos!
Aqui estou, postando minha última atualização no blog deste ano de 2012, que, para mim, foi repleto de alegria, excelentes notícias, realizações, viagens, novas amizades, recados carinhosos deixados por vocês, meus leitores, que aumentaram significativamente o lastro desse Mar da Vida pelo qual navegamos! Eu aceito e agradeço por essas dádivas com o coração em festa!
Meu livro Tempo Submerso, está sendo traduzido para o inglês e, até meados desse próximo ano, estará também na versão em e-book.
Assim, hoje, orgulhosa, eu publico aqui, a última resenha que recebi, feita por um amigo muito especial: *Fabiano Mauro Ribeiro.
TEMPO SUBMERSO – Livro da escritora Ludmila Saharovsky, radicada em São Paulo, conta uma viagem de recordação em busca de seu passado na sombria história da antiga União Soviética
Ludmila Saharovsky, nasceu no campo de refugiados Lager Parsh, em Salzburg, Áustria, em novembro de 1948. A família sofria a perseguição da ditadura stalinista, tendo abandonado o local de origem no norte da Rússia. Na década de 50, se transferiram para o Brasil, fixando-se em São Paulo, e a seguir na cidade de Jacareí no Vale do Paraíba.
Como diz a própria escritora no inicio da Parte II de seu livro “o passado é um vasto continente localizado em nós e habitado por múltiplas lembranças.” É assim que criada nos costumes russos, muito bem retransmitidos em suas narrativas, vai nutrindo vida a fora, o desejo do que ela chama, logo nos primeiros momentos em que desembarca mais tarde em 2003, na sua viagem de reencontro, de realizar “ a procura de seus mortos..”
Essa procura que acaba num mítico confronto, será numa Rússia do século XXI, em que ruiu a Cortina de Ferro. Agora não se tem mais o temor das tormentas, que desde o trucidamento da família Imperial, em 1917, ocuparam a atmosfera do país, e alimentaram a chamada Guerra Fria, assombração da população mundial. A autora se serve da tinta final para o quadro que ela deixou inacabado um dia na sua infância. É doloroso porém a constatação das nuvens carregadas lembrando as incrustações frias de Solovietskie Ostrova, que faz parte de sua revista, no mar que por ironia, se chama “Mar Branco”.
Essas sombras foram as que geraram afinal o seu regresso, a sua peregrinação, aos recantos onde ficaram pedaços dos corpos e dos espíritos de sua gente submergidos no tempo. Tempo Submerso, exatamente como salienta a autora do prefácio, é o tempo que Ludmila vem redescobrir e tentar aflorar em sua viagem.
Mas em oponibilidade às sombras, está a luz nas recordações familiares com Ivan Fiodorovich Saharov, o avô e Alecsandra Dmitrivna Kudriavseva, a avó. Lembranças das habilidades e do convívio com Ivan, que desgastado o corpo, contrai tuberculose. Sua sabedoria, porém, sua habilidade em lidar com coisas da natureza e do dia a dia situado nos costumes típicos do povo russo, torna-o a figura de maior ternura na vida da autora, que narra esse lidar com minúcia cativante. É o seu grande anjo da guarda na nova vida no Brasil, uma vez que os pais têm de se ausentar para o sustento dos 5 refugiados. O avô está assim mais próximo dela do que o pai.
Abre-se aí um aprendizado amplo e agradável de se ler, com os costumes e o convívio na família russa. Alecsandra tem uma personalidade delicada, dispensando extremo cuidado na condução da vida dos netos, ainda que cheia de atribulações, mormente num país estranho. Ivan, apesar de militar graduado pela antiga Academia Militar de San Petrsburgo, mesmo portador da doença crônica, era um sensível pelos próprios descendente, pela natureza, e pela religião católica ortodoxa – isso a autora frisa ao se recordar da sua preocupação, já morando em São Paulo, em modificar a consistência das velas utilizadas nos ícones no Monastério Ortodoxo de Vila Alpina. Ele se apaixonava pelas pedras e seus mistérios, e mergulhava na leitura de antigos livros de Montezuma, sobre os astecas. Um personagem que tem passagem livre para os grandes romances dos autores russos clássicos.
Mas o Tempo Submerso, é um tempo de duas polaridades, sendo uma outra cruel, que é latente em todo o decorrer do livro – a lembrança dos Gulags, implantados pela ditadura de Stalin, sendo o primeiro deles instalado no antigo Mosteiro originário da velhíssima Catedral da Transfiguração do Salvador, em Solovki. Esse templo depois de várias modificações e de ter sido fechado em 1923, veio a abrigar o primeiro Gulag, de nome SLON, enunciando o nome do Departamento, mas que num trocadilho significava “elefante”. Em 22, bolcheviques teriam ateado fogo ao edifício. A palavra Gulag é um acrônimo de Glavnoie Upravlenie Lagerei (Administração Central dos Campos).
Num desses Gulags, ficaram os mortos do passado da autora, que levou os nomes peregrinando nos setores disponíveis no momento, agora aparentemente livres para pesquisas – Fiodor Saharov, Natalia, Nadejda, Irina. Todos ascendentes, e que os vivos ainda deixaram com vida na Rússia. A encarregada dos sistemas, burocrata, mas solicita, atende à autora. Nas consultas e pesquisas, vai surgindo uma galeria de horrores daquele passado submerso, através fotos e apontamentos. O tempo submerso permanece, mas agora é móvel no revolver lembranças gravadas a ferro e fogo – e a autora se familiarizou definitivamente com ele. O final é para o leitor, que lerá tudo de uma assentada, e saberá ajuntar esse depoimento como página importante de testemunho de uma das maiores barbáries que a humanidade já contemplou, tal e qual o nazismo, e que por certos canais ainda merece certo ofuscamento em divulgar.
*Fabiano Mauro Ribeiro
Fabiano é advogado, pesquisador de historia e arte e colabora para várias publicações nacionais no gênero.
*Fabiano…sem palavras! A emoção desse texto que me enviou, eu guardei no compartimento de presentes raros, no baú mais precioso de meus tesouros.
Beijão, amigo!
Ludmila Saharovsky